Skip to main content

Captain, My Captain, ficou tudo bem, mas não como eu esperava…

Captain, My Captain, ficou tudo bem, mas não como eu esperava…

PROALU - Programa de Acolhimento ao Luto

Por Samantha Mucci

A última vez que ouvi sua voz, ele estava com cara de dor com a mão sobre o peito sendo carregado e dizendo que iria ficar tudo bem. Mas ele foi pra UTI, havia enfartado. Na época, não se faziam transplantes cardíacos em maiores de 60 anos, a saída foi seda-lo e colocar o balão intraórtico.

Três dias depois veio a notícia de uma forma abrupta e violenta para meu irmão mais velho primeiro: “por favor, Dr. preciso que venha reconhecer o corpo do seu pai aqui no necrotério.” Meu irmão segurou o nó na garganta e respondeu ao telefone que já estava a caminho, mas preservou por anos todos nós dá forma que foi lhe dado a notícia que nosso pai havia morrido.

Horas depois o comunicado era inevitável e ele que teve que nos contar. A dor foi tão grande que gritei, chorei gritado, me revoltei, afinal, acreditei que iria ficar tudo bem.

Estava sem chão, sem lugar no mundo naquele momento. A dor era avassaladora. Dor no peito, falta de ar, sai correndo pelas escadas, desci no prédio pra chorar. Eu não queria acreditar que ele havia morrido… nos faltou tempo de vida juntos.

Na sequência, fomos para o velório. Precisava vê-lo para acreditar. Muitos querendo me consolar: “meus sentimentos” e eu pensava: “que absurdo essa formalidade de meeeuuusss sentimentosss! Que babaquice sem sentido, sem lógica. Vazio, sem qualquer consolo ou carinho.”

No meio da madrugada, uma boa alma me levou pra tomar coca-cola, não conseguia comer nada. Não me lembro quem foi, mas me senti cuidada. Voltamos pra sala do velório e lá ele estava, com a mesma cara de sempre (aquela cara que diz: eu estou aqui por vc sempre!), mas ele não estava mais e nem estaria, e eu já sabia. Eu o beijei um monte de vezes, disse como sempre dizia que o amava muito, mas eu não sabia como iria viver sem ele. Captain, my Captain, pra onde vc foi? Como isso aconteceu agora? Fiz algo que contribuiu pra você morrer? Como faço essa dor desaparecer? Porque você não levanta e acorda? Era tudo que eu pensava… e foram chegando pessoas e mais pessoas, eu sai um pouco da sala e a ante sala estava lotada. Voltaram se olhares de pena em minha direção, amigos dele me diziam: “seu pai era maluco por você”, “você era a razão dele viver” e eu chorava. Pensava sobre como em tão pouco tempo a morte poderia levar quem mais amamos…. poderia me levar…. levar todos que eu amo! Fiquei assustada!

Fui pra perto dos meus amigos um pouco, e de repente, como mágica pensei que ouvi a voz dele contando suas piadas tradicionais para velórios… sai atrás da voz, mas não era a voz dele, era o meu irmão mais velho junto com os demais comandantes aposentados da VASP… abracei o e entrei pra sala. Lá meu irmão do meio chorava e cochichava abraçado ao corpo de meu pai. Chorei demais quando vi aquela imagem, cheia de amor, sentimentos de culpa e de arranjos de despedida sem a resposta devida. Não dava mais para dizer o que não foi dito em vida…

E então, chegou minha mãe, chorei e logo depois fecharam o caixão. Se eu pudesse elencar um dos piores momentos que já vivi, esse com certeza ganha! A dor da certeza que não o veria nunca mais, não poderia abraça-lo, beija-lo… não teria mais ele por perto. A dor aumenta que quase me fez desmaiar. Precisava gritar e chorar, mas ali não dava mais. Não queria mais ficar perto das pessoas.

Os dias subsequentes foram esmagadores, os meses confusos, a vida ficou cinza e bem estranha… me senti perdida, sem referência, tendo que rever meu mundo que não era mais aquele que era tão seguro. Tinha 17 anos, não tinha amigos que haviam lidado com a morte ainda e eu me sentia muito sozinha… então, fui pra psicoterapia e lá fui entendo algumas vivências, expressando minhas dores, a dor aguda que apertava o peito foi se transformando em saudade de tempos que não voltariam. Minha terapeuta não era somente psicóloga, ela foi uma referência, um mestre Yoda, um caminho, uma companhia que trazia luz, cor e alegria. Mas haviam dias cinzentos, e em um deles me deparei com o meu maior medo: esquecer como ele era e quem ele era pra mim. Mesmo com medo, continuei o processo. Aos poucos, fui me conhecendo e aprendendo a conviver com a dor da ausência na presença. Entendi que ele sempre está comigo e é impossível esquecer o amor, o carinho e o tempo juntos. Tive a certeza de que a morte tem uma força imensa de transformação. É preciso saber viver com paixão, intensidade, sentido, todos os dias de nossas vidas!

Mas confesso, por muito tempo, deixei de acreditar quando me diziam que iria ficar tudo bem…

 

*** Se você quiser compartilhar sua memória em nosso blog, nos conte sobre a pessoa querida que você perdeu, sobre sua história e nos envie uma foto que publicaremos nas Memórias para sempre lembradas.

E-mail: contato@proalu.com.br

Deixe seu Comentário